1. Em que aspectos, na sua opinião, a literatura infanto-juvenil reina?
Na aventura. Acho que nenhum outro gênero sabe lidar tão bem com a metáfora da vida
como a Literatura Infanto-juvenil, justamente porque o público para o qual esta destinada em primeira mão é um público que está descobrindo a imensa aventura que é a vida.
2. Dos 40 encontros que a Confraria Reinações promoveu, qual foi o mais marcante para você? Por quê?
Infelizmente, eu não pude participar da maioria e não pude participar justamente daqueles que eu mais queria, que foram os encontros para discutir A História Sem Fim, de Michel Ende e O Hobbit, de Tolkien. Mas dos poucos encontros a que fui, adorei aquele em que se discutiu A Volta ao Mundo em 80 Dias, de Verne. Foi interessantíssimo, porque me dei conta de coisas sobre a recepção de texto que de modo geral a gente vê mais em artigos e livros sobre Literatura.
3. O que não pode faltar num texto que se destina à criança e/ou ao adolescente?
Qualidade, mas isso é um pouco bobo de se dizer: toda a obra, seja de literatura, ou de qualquer outra forma de Arte deve ter um compromisso expresso com a qualidade. O quesito seguinte é a emoção. Mesmo quando se está contando uma história de aventura, se ela não tiver emoção, se ela não falar de seres humanos com seus defeitos, anseios, qualidades, medos e coragens, se ela não falar ao coração, o leitor ficará de fora, será quase excluído. Sua única função seria decifrar o texto. E a parte do leitor, na minha opinião, é reinventar o texto a partir da leitura, que estará repleta de significados próprios, nascidos de sua experiência de vida. Neste sentido, a Literatura é uma via de mão dupla, e o leitor tem uma função tão importante quanto a do escritor, tenha ele a idade que tiver.
4. Você tem vários livros juvenis que se caracterizam por mergulhar num universo fantástico, sendo que, hoje, vê-se na fantasia uma vertente bastante interessante para quem produz literatura. Por que, na sua opinião, o fantástico é fonte de atração para os leitores jovens?
Acho que de uma maneira geral, a Fantasia é o gênero onde melhor se pode jogar com as metáforas sobre o cotidiano e por isso muitos jovens leitores sentem-se mais à vontade com ela – e não só os jovens leitores, diga-se de passagem. As metáforas são comuns em todos os gêneros, mas a Fantasia parece mais à vontade em se deixar ler em diferentes níveis e o leitor pode escolher em qual deles vai se inserir. Só para citar uma obra que já foi lida na Confraria, você pode ler A História Sem Fim como um excelente texto, como uma espécie de história de fadas, como uma fantasia psicológica e por aí vai, até chegar às metáforas que provavelmente o autor inseriu conscientemente, àquelas que ele não imaginou que estivesse inserido e àquelas que só o leitor será capaz de encontrar. Mas você não precisa ir tão longe para curtir o livro. Já uma obra como A Volta ao Mundo em 80 Dias, que têm um pé mais calcado na realidade, as metáforas são menos agudas, embora a profundidade de seus personagens não perca nada com isso.
Existe um outro aspecto para o qual J.R.R.Tolkien chamava atenção sobre as histórias de Fantasia em sua palestra “Sobre as Histórias de Fadas”, que ele proferiu na Universidade de St. Andrews, na Escócia, em 1937, e que acho importante sublinhar: muitos críticos acusam a Fantasia de ser uma literatura escapista. Mas, de acordo com o autor de “O Hobbit”, não se trata de uma “deserção” da realidade, senão de um “escape” em busca de alento para continuar a enfrentar um mundo que às vezes se faz incompreensível e extremamente duro e injusto – e não é a “injustiça” a principal reclamação do adolescente diante das negativas do mundo adulto? Este “escape”, diz Tolkien, é para voltar revigorado ao cotidiano – e é assim que eu me sinto quando leio uma boa história de Fantasia.
E por último, mas não menos importante, acho que no momento atual a Literatura de Fantasia é capaz de oferecer ao seu leitor valores que andam esquecidos: honestidade, honra, coragem, persistência... sei lá, uma lista muito grande. Não que os outros gêneros não tratem destes valores, mas a Fantasia parece estar completamente embasada neles. O mundo em que vivemos está passando por uma crise enorme de valores e a Fantasia, por estar profundamente relacionado com o Épico e o Drama, se enche desta gama de valores, sem analisá-los à luz do cotidiano. Em Coração de Tinta, de Cornélia Funke, por exemplo, é a coragem, o amor e a certeza de Mo e sua filha que vencem o terrível Capricórnio com a simples força da palavra – e mesmo assim, o mundo que fica para eles após a passagem do grande vilão não é o perfeito “viveram felizes para sempre”. Livros como este nos dizem: “você pode, você consegue. E se o mundo não for perfeito depois de você ter conseguido, pelo menos você será melhor e terá conquistado algo de valor em si mesmo”. Acho que precisamos acreditar nisso nos dias de hoje.
5. Como você avalia o atual momento pelo qual passa a literatura infanto-juvenil gaúcha?
Acho que é um momento muito rico, com nossos autores surgindo com força no cenário nacional. Basta ver a lista de candidatos ao Jabuti Juvenil deste ano: autores e editora gaúchas estão na lista. O que está faltando é conquistar espaços de relevância dentro do nosso próprio estado. Por que o Prêmio Zaffari, outorgado durante a Jornada de Passo Fundo, não dedica um ano para a Literatura infanto-juvenil, por exemplo? Não adianta apenas a gente ter autores e empresas de expressão. Precisamos conquistar mais espaços de repercussão, para chegar mais aos leitores. Se a nova Lei dos Direitos Autorais for aprovada do jeito que está, por exemplo, as editoras e livrarias – e os autores, por extensão – terão de repensar sua estratégia sobre como chegar aos leitores, porque as escolas deixarão de ser um público tão certo quanto eram até agora. Para usar uma metáfora, precisamos atravessar os portões da escola e chegar à rua e ali disputar o território com autores de outros países e com outras coisas que não a leitura: disputar o tempo do leitor com o celular, a internet, o mp3, as comprinhas no shopping e a novela da TV. Eu sou um bocado ambiciosa, já se vê, mas precisamos ser positivamente ambiciosos.
6 . Que dica de leitura você daria aos confrades da Reinações? Por quê?
Na aventura. Acho que nenhum outro gênero sabe lidar tão bem com a metáfora da vida
como a Literatura Infanto-juvenil, justamente porque o público para o qual esta destinada em primeira mão é um público que está descobrindo a imensa aventura que é a vida.
2. Dos 40 encontros que a Confraria Reinações promoveu, qual foi o mais marcante para você? Por quê?
Infelizmente, eu não pude participar da maioria e não pude participar justamente daqueles que eu mais queria, que foram os encontros para discutir A História Sem Fim, de Michel Ende e O Hobbit, de Tolkien. Mas dos poucos encontros a que fui, adorei aquele em que se discutiu A Volta ao Mundo em 80 Dias, de Verne. Foi interessantíssimo, porque me dei conta de coisas sobre a recepção de texto que de modo geral a gente vê mais em artigos e livros sobre Literatura.
3. O que não pode faltar num texto que se destina à criança e/ou ao adolescente?
Qualidade, mas isso é um pouco bobo de se dizer: toda a obra, seja de literatura, ou de qualquer outra forma de Arte deve ter um compromisso expresso com a qualidade. O quesito seguinte é a emoção. Mesmo quando se está contando uma história de aventura, se ela não tiver emoção, se ela não falar de seres humanos com seus defeitos, anseios, qualidades, medos e coragens, se ela não falar ao coração, o leitor ficará de fora, será quase excluído. Sua única função seria decifrar o texto. E a parte do leitor, na minha opinião, é reinventar o texto a partir da leitura, que estará repleta de significados próprios, nascidos de sua experiência de vida. Neste sentido, a Literatura é uma via de mão dupla, e o leitor tem uma função tão importante quanto a do escritor, tenha ele a idade que tiver.
4. Você tem vários livros juvenis que se caracterizam por mergulhar num universo fantástico, sendo que, hoje, vê-se na fantasia uma vertente bastante interessante para quem produz literatura. Por que, na sua opinião, o fantástico é fonte de atração para os leitores jovens?
Acho que de uma maneira geral, a Fantasia é o gênero onde melhor se pode jogar com as metáforas sobre o cotidiano e por isso muitos jovens leitores sentem-se mais à vontade com ela – e não só os jovens leitores, diga-se de passagem. As metáforas são comuns em todos os gêneros, mas a Fantasia parece mais à vontade em se deixar ler em diferentes níveis e o leitor pode escolher em qual deles vai se inserir. Só para citar uma obra que já foi lida na Confraria, você pode ler A História Sem Fim como um excelente texto, como uma espécie de história de fadas, como uma fantasia psicológica e por aí vai, até chegar às metáforas que provavelmente o autor inseriu conscientemente, àquelas que ele não imaginou que estivesse inserido e àquelas que só o leitor será capaz de encontrar. Mas você não precisa ir tão longe para curtir o livro. Já uma obra como A Volta ao Mundo em 80 Dias, que têm um pé mais calcado na realidade, as metáforas são menos agudas, embora a profundidade de seus personagens não perca nada com isso.
Existe um outro aspecto para o qual J.R.R.Tolkien chamava atenção sobre as histórias de Fantasia em sua palestra “Sobre as Histórias de Fadas”, que ele proferiu na Universidade de St. Andrews, na Escócia, em 1937, e que acho importante sublinhar: muitos críticos acusam a Fantasia de ser uma literatura escapista. Mas, de acordo com o autor de “O Hobbit”, não se trata de uma “deserção” da realidade, senão de um “escape” em busca de alento para continuar a enfrentar um mundo que às vezes se faz incompreensível e extremamente duro e injusto – e não é a “injustiça” a principal reclamação do adolescente diante das negativas do mundo adulto? Este “escape”, diz Tolkien, é para voltar revigorado ao cotidiano – e é assim que eu me sinto quando leio uma boa história de Fantasia.
E por último, mas não menos importante, acho que no momento atual a Literatura de Fantasia é capaz de oferecer ao seu leitor valores que andam esquecidos: honestidade, honra, coragem, persistência... sei lá, uma lista muito grande. Não que os outros gêneros não tratem destes valores, mas a Fantasia parece estar completamente embasada neles. O mundo em que vivemos está passando por uma crise enorme de valores e a Fantasia, por estar profundamente relacionado com o Épico e o Drama, se enche desta gama de valores, sem analisá-los à luz do cotidiano. Em Coração de Tinta, de Cornélia Funke, por exemplo, é a coragem, o amor e a certeza de Mo e sua filha que vencem o terrível Capricórnio com a simples força da palavra – e mesmo assim, o mundo que fica para eles após a passagem do grande vilão não é o perfeito “viveram felizes para sempre”. Livros como este nos dizem: “você pode, você consegue. E se o mundo não for perfeito depois de você ter conseguido, pelo menos você será melhor e terá conquistado algo de valor em si mesmo”. Acho que precisamos acreditar nisso nos dias de hoje.
5. Como você avalia o atual momento pelo qual passa a literatura infanto-juvenil gaúcha?
Acho que é um momento muito rico, com nossos autores surgindo com força no cenário nacional. Basta ver a lista de candidatos ao Jabuti Juvenil deste ano: autores e editora gaúchas estão na lista. O que está faltando é conquistar espaços de relevância dentro do nosso próprio estado. Por que o Prêmio Zaffari, outorgado durante a Jornada de Passo Fundo, não dedica um ano para a Literatura infanto-juvenil, por exemplo? Não adianta apenas a gente ter autores e empresas de expressão. Precisamos conquistar mais espaços de repercussão, para chegar mais aos leitores. Se a nova Lei dos Direitos Autorais for aprovada do jeito que está, por exemplo, as editoras e livrarias – e os autores, por extensão – terão de repensar sua estratégia sobre como chegar aos leitores, porque as escolas deixarão de ser um público tão certo quanto eram até agora. Para usar uma metáfora, precisamos atravessar os portões da escola e chegar à rua e ali disputar o território com autores de outros países e com outras coisas que não a leitura: disputar o tempo do leitor com o celular, a internet, o mp3, as comprinhas no shopping e a novela da TV. Eu sou um bocado ambiciosa, já se vê, mas precisamos ser positivamente ambiciosos.
6 . Que dica de leitura você daria aos confrades da Reinações? Por quê?
Vou dar uma sugestão meio fora de moda: Um ianque na corte do Rei Arthur, de Mark Twain. Twain é maravilhoso, sua prosa é fina, irônica, divertidíssima! Prova que a Fantasia pode se dar muito bem com a ironia e o bom humor, sem deixar de lado o maravilhoso. Afinal, o livro se coloca “cientificamente” quanto a muitas “mágicas” de Merlin... mas não explica como o protagonista vai parar no tempo dos cavaleiros da Távola Redonda.
7. Que palavra de Confrade você gostaria de conhecer mais?
Marô Barbieri, que tem uma produção bastante expressiva e uma atitude corajosa frente ao mercado editorial tradicional.
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