Beatriz Abuchaim é psicológia e escritora. Participou da Oficina de Criação Literária com o escritor Charles Kiefer e, em 2008, publicou seu primeiro livro individual: Habitantes de corpos estranhos (Editora Projeto), uma coletânea de contos que aborda o universo juvenil, com suas problemáticas, suas neuras, suas dúvidas e certezas. Abaixo, Beatriz, que já participou de vários encontros da Reinações, tendo, inclusive coordenado o debate sobre A fantástica fábrica de chocolate, de Roald Dahl, nos dá sua palavra.
1.Para você, em que aspectos a literatura feita pra crianças e adolescentes reina?
Reina em inúmeros sentidos. Em primeiro lugar, pela possibilidade de formar novos leitores. Em segundo, pela introdução na vida de crianças e jovens de um espaço para reflexão sobre suas existências. Em terceiro, pela satisfação da necessidade que nós adultos temos de nos conectarmos com a criança e o adolescente que um dia fomos, e que ainda, de certo modo, somos. Literatura infanto-juvenil é assunto de gente grande. Grande não porque cresceu, mas porque se permite, de vez em quando, a grandeza de reinventar o mundo, como crianças e adolescentes bem fazem.
2. Qual o encontro da Reinações que mais marcou sua história de leitor? Por quê?
Gostei muito do encontro em que debatemos a obra de Silvia Orthof. Foi divertido e estimulante, porque havíamos lido textos diferentes da autora e cada um falou um pouco de suas impressões. Fiquei motivada a conhecer outros livros dela. Talvez o meu prazer maior em ter conhecido esta autora na Confraria tenha vindo depois, quando dei O sapato que miava para meu sobrinho. Estávamos na casa de minha irmã e daqui a pouco eu encontro a minha mãe às gargalhadas, vocês podem imaginar fazendo o quê.
Aprendi que autores como a Silvia, com seu texto simples, gracioso e ao mesmo tempo profundo, são exemplos de que a Literatura infanto-juvenil de qualidade reina a qualquer tempo, com quaisquer leitores.
3. Com você percebe a literatura para crianças e adolescentes feita no Rio Grande do Sul?
Não sou uma expert no assunto, mas acho que temos muita coisa boa sendo produzida pelos gaúchos. Ainda (e isso é inacreditável neste nosso suposto mundo globalizado) a literatura gaúcha, de modo geral, não fez todo o barulho que mereceria em nível nacional. Espero pertencer a geração de escritores que faça essa virada de mesa.
4. Percebe-se na literatura para adolescentes certa predileção por novelas. O que a levou a optar pelo conto em "Habitantes de corpos estranhos"?
Na verdade, existem poucos livros de contos para adolescentes, não? Optei pelo conto em “Habitantes...” porque desejava contar muitas histórias que levassem a diferentes reflexões.
Independente do gênero (se conto, novela ou romance), gosto de textos que tenham economia narrativa, ou seja, que digam muitas coisas em poucas palavras. Acho que a Literatura é um jogo de luz e sombra, o qual o autor tem de possuir a arte de revelar e, principalmente, de esconder, pois é isso que permite a interatividade do leitor com texto. O leitor só consegue “entrar” na história se damos espaço para ele imaginar em cima dela e, por isso, pode ser um risco muito grande revelar tudo. O fundamental é mostrar, descrever e deixar que o leitor complete o trabalho de interpretação. O conto tem essa estrutura econômica de construir um universo inteiro em três, quatro páginas, porque joga, sobretudo, com o subtexto, o que está implícito à história, o que não se diz escancaradamente, mas se sugere.
5. Deixe aqui uma dica de leitura para os confrades. Não esqueça de fazer um comentariozinho sobre ela.
Indico um livro que me encantou em minha adolescência e que lido depois (de velha) causou-me o mesmo efeito. Acho que não é uma obra de literatura juvenil propriamente dita, não foi escrita para o público jovem, mas possui todos os atrativos para apaixonar jovens e adultos. Chama-se O apanhador no campo de centeio, de J. D. Salinger.
Esta obra conta a história de um adolescente que, expulso de um internato, faz seu caminho de volta para casa. O personagem é muito bem construído, livre de quaisquer estereótipos, e a narrativa se sustenta até o final com a dose certa entre tensão e fluidez.
6. Que Palavra de confrade você gostaria de ler?
Gostaria de ler as palavras da confrade Maria da Graça Artioli.